quarta-feira, 20 de agosto de 2008


A menina se chamava Elisa.
[e gostava do seu nome: achava Elisa um nome colorido.]

quando sorria era de sabedoria
não se deixava enganar por flores
para ela os orvalhos resplandeciam
tinha como amigas as aranhas
poucas vezes em que chorava
- quando não engolia o choro -
sentia-se mãe de cada lágrima que escorria...



um dia Elisa
se cresceu.



adquiriu uma certa parceria com botas cor preta.
tinha face corada, cabelo liso também preto
com franja à altura dos olhos.
se divertia em rapazes
e costumava desenhar estrelas nos cadernos

gostava de cheiro de batom de cereja
comia sanduiche na escadaria da igreja

dava bom dia ao trocador e sentava-se, séria, na penúltima cadeira do ônibus.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

.

mesmo que não quisesse mordi o gosto do fim
minha fonte secou de prantos

os olhos fechados me vi
sem cores no escuro

sem cores

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

A chuva deformou a cor das horas

domingo, 3 de agosto de 2008

Ela havia se cansado. De tudo e de todos. E das lonjuras que inventara para si.

Cansada de si? Cansada do não. Nessa instância a sua vida se tecia de arrependeres, como uma louca ela colecionava desejos passíveis, possíveis, profanos, amores sem chances, luares sem pares, a vida passava entre os dedos abertos.

Com a embriaguez do sono a pesar suas pálpebras, colocou a última carta em seu castelo, foi se deitar. Na cabeça a trilha sonora do filme de domingo, cabelos molhados e a chuva caindo lá fora... por sobre seu teto as estrelas. O gosto úmido daquela noite a incomodava – e profundamente. O cheiro triste da dama-da-noite que a tudo se impregnava não respeitava fechaduras nem cadeados, mas que diabo! Ainda havia de cortar um dia aquele pé de dama-da-noite, sim, havia... Isso ela prometera a si mesma – mais uma para sua coleção de promessas, essa não passaria batido.

O cheiro doce da madrugada se confundindo com o cheiro de seus devaneios, ocultos desejos, nostalgias de sonhos de infância, tudo era macio demais... Inclusive a escuridão do quarto: macia. Como um abismo.