terça-feira, 24 de junho de 2014

foram asas que se abriram
naquela brecha entre as horas:

acima dos poros das páginas
palavras lidas pairavam livres
latejando frescas vertigens

e eu
a desbravar delírios em rios alheios, mergulhei
até  vislumbrar o deslumbre no fundo da
ácida-alma-ávida

onde pulsava a poesia a retumbar espasmos
a inspirar faísca
nos velhos marasmos

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Ametista



Naquele dia a cidade era o cenário de um cinema mudo – e os bobos transeuntes? Todos eles meros figurantes daquele longuíssima-metragem que, de tão mudo que era, até mesmo os barulhentos motores dos motociclistas só tinham lugar na última e longínqua camada de neblina branca.

Naquele dia, despontando de um mar de baixas pálpebras, nítido, lúcido, um olhar me fisgou. Foi então que, por um segundo, algo se pôs a brilhar em meio àquela opacidade geral.

Aquele olhar-anzol... Que fisgou dentro de mim um fiapo de vertigem, trazendo-me para a superfície da água morna em que cotidianamente me encontro imersa; trazendo-me à superfície, à tona: assim como quando por um instante se sente a brisa fria soprando a pele ainda molhada – brisa indesejável na medida em que nos queima em frio, mas que nos vivifica ao trazer a existência toda pra perto do corpo; a existência pungente beirando a pele.

Um olhar vivificou o que quase se perdia distraidamente no esquecimento, em meio às plumas brancas de minha memória. Ali, em meio às plumas, no fundo – eu não sabia – havia ali uma pedra ametista. Aquele olhar alheio, complacente, clandestino, fez brilhar uma das pontas da ametista em meio às plumas. Foi isso?

Meu coração é uma pedra ametista?

Que ainda brilha.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

terça-feira, 27 de março de 2012

Pós-posologia


goela abaixo um gole bem dado -
engasgo de vida que eu dei!
na boca do gargalo

feito remédio que não se toma:
que faz hora, que faz manha,
mas acaba que se toma

meio copo, meio ano,
seis medidas concentradas
da mais densa substância

êta dose com sustança!

o gosto seco do sol
o peso leve do ar

foi leve o peso de ser
naquelas bandas de lá