quarta-feira, 8 de julho de 2009

Lambia os dedos com saliva e saboreava aquelas páginas férteis de palavras, mastigando-as uma a uma, sem piedade. Até os pingos dos is ela mastigava, a mais indigesta das palavras ela triturava entre os dentes, meu deus. A mãe sempre falara do olho que era maior que a barriga. Da boca de Clarice transbordavam as letras avulsas, partidas, inteiras, cuspidas. (Sim, porque dos poemas até aceitamos de bom grado engolir o sumo das entrelinhas, mas as letras ficam.) Era comum engasgar-se com as vírgulas, ciscos nos olhos da menina. Crocodilo era palavra crocante coberta com caramelo e Sublime tinha o gosto da noite no céu. Fazer poema, para Clarice, era sorrir e o poema saía, salpicava de estrelas o silêncio do papel, quando lhe perguntavam o que queria ser quando crescesse ela respondia bem isso, que queria ser dessilenciadora.